quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

South Island (parte 2): “Into the wild”

Em meu último dia em Queenstown acordei cedo porque sabia que partiria, mas não fazia a menor ideia de como e nem para onde (quer dizer, deveria ir para o norte) . Quando estava fazendo meu check out no albergue, a dona me perguntou para onde eu iria e disse que não tinha certeza. Ela me ofereceu uma passagem para Wanaka, uma cidade uns 170 km de distância. Comprei o ticket do ônibus que sairia em 15 minutos. Claro que perdi, né? Voltei no albergue para decidir o que fazer. Um próximo ônibus só em três horas, mas eu não tava nem um pouco afim de esperar. Queria seguir viagem, meu tempo na cidade já tinha dado... Pedi meu dinheiro de volta (eles devolveram!!!!) e resolvi tentar pedir carona... tinha três horas, se rolasse, ótimo, economizaria, caso contrário, voltaria e iria de ônibus.

Confesso que a primeira esticada do dedão não foi assim tão simples. Afinal de contas, uma coisa é pedir carona na Lagoa da Conceição (olha que hoje em dia nem sei se me arriscaria) e outra é fazer isso em um outro país, mas na NZ todos me disseram ser super tranquilo e seguro. Resolvi arriscar.

Depois de uns 50 metros caminhando, a coragem veio e o dedão com ela. Esperei bem menos de cinco minutos e parou um cara super simpático. Disse que não iria para Wanaka, mas me deixou em uma autoestrada onde seria mais fácil de pegar carona. E foi. Ele me largou, dei uns 10 passos e um casal de asiáticos (acho que eram tailandeses, não sei) parou. No que eu estava entrando no carro, parou um outro carro atrás e uma mulher pediu pra eles também darem carona para um francês... 500 metros mais a frente um outro cara pedindo carona. O casal nem hesitou, parou e mais um se juntou a gente.

Depois de muitas curvas (por sinal, quem tem problemas com estradas sinuosas não consegue viajar por aqui. Praticamente não existe estrada plana e reta, é sempre subindo e descendo serra) e paisagens lindíssimas, Wanaka. O lugar é bem menor que Queenstown e Taupo, mas aquela mesma história de lago, com montanhas e neve no cume. Decidi só descansar e caminhar ao redor, sem pressão de saber sobre nada, nem trilhas... E em Wanaka foi isso, meio dia e uma noite. Acordei cedo no dia seguinte e de novo pronta pra colocar o pé na estrada...

Sabem aquele filme “Chocolate”, em que a mulher precisa mudar de cidade sempre que batia um vento?! Então, a vibe se tornou essa. Ia pra cama sem saber o que aconteceria no dia seguinte e, às vezes, acordava certa de que meu tempo ali tinha dado. Colocava a mochila nas costas e ia com a ideia de “vou para onde o primeiro carro que parar estiver indo”.

Quem viu o filme “Into the wild” (“Na natureza selvagem”, na tradução brasileira. O link foi o primeiro do Google, mas a sinopse dá uma ideia boa da história... hehe) talvez entenda melhor minhas divagações daqui pra frente... Tinha assistido o filme em São Paulo, choreiiiii muito e, de primeira, se tornou um dos meus preferidos. Vi de novo em Taupo e ganhei o livro de presente antes de partir. E daí que Alex Supertramp foi meu companheiro de viagem... e viagens. As conexões foram constantes e intensas... Não teria livro mais perfeito para aquele momento.

Dessa vez meu destino eram os glaciares, umas quatro horas de distância de Wanaka. Mas não sabia ao certo quais das duas cidades que há na região, se Fox Glaciares ou Franz Josef. Acho que saí muito cedo do albergue nesse dia, antes das oito já estava na rua e era domingo (mas, claro que não fazia idéia do dia da semana. Um dos caras que me deu carona que me disse). Caminhei quase quarenta minutos e NENHUM carro passou por mim... e nisso eu ia me afastando da cidade, o tempo fechando e a chuva começando a cair fininha.... Só passavam casal de velhinhos (maioria asiáticos – que não param de jeito nenhum) com carrão ou família com o carro lotado. Até que me parou um cara, daqueles bem grandões, dois por dois, que a cabeça vai grudada no teto. Eu tava pronta pra dizer “oi, desculpa, mas eu não me sinto segura contigo!”. Quando ele abriu a porta e junto um sorrisão, tive certeza que era inofensivo. Fazia só um tipo Sherek... Ele seguiria para o sul, naquele momento, mas me deixaria em uma autoestrada... E foram mais alguns quilômetros. Ainda antes de eu descer ele me disse que caso eu não conseguisse carona logo, ele iria no fim do dia para o destino que eu pretendia (e, de fato, no dia seguinte o encontrei no meio de uma trilha), e pararia para mim de novo. Ok, chegaria ao meu destino em algum momento daquele dia..

Depois de uns 10 minutos andando, um gurizão fumando um cigarro, bebendo um café, ainda meio dormindo e reclamando que teria que trabalhar no domingo, parou... Foram só mais uns 20 km, mas quando se pede carona, 1km é sempre 1km... E daí que parei no meio de nada e cada vez mais estava no meio de nada... e caminhando para o nada... e o tempo fechando... subindo e descendo morro e nada.. ninguém passava.

Foi louco quando me vi ali, com minha mochila nas costas, andando pela estrada, sem saber bem ao certo para onde. Primeiro pensei “sou completamente louca”, por questões de segurança, mesmo (brasileira, mulher, sozinha, no meio da estrada, não tinha como pensar diferente)... mas depois de passar essa pira de segurança e tal eu queria só andar. Os carros passavam e eu nem queria que eles parassem. Queria só andar. E isso aconteceu em alguns momentos, não só ali como em outras estradas... e, às vezes, era ruim porque me sentia a pessoa mais sozinha do universo e porque a saudade dos meus e dos que deixei para trás doía muito... mas outros momentos era ótimo. Me sentia tão bem, comigo ali no meu caminho. Só eu e eu... e assim segui, falando comigo mesma, cantando, chorando, rindo. Sim, definitivamente parecia uma louca. Mas não estava nem aí. Me sentia bem...

Foi então que um casal que viajava em uma van parou. Fui sentada por mais de três horas em cima do colchão deles, dividindo espaço com as malas. No que eu entrei no carro, a chuva caiu sem dó nem piedade e continuou assim até chegarmos a Fox. Fiz a trilha com eles (que dava no começo dos glaciares, tipo uma cachoeira enoooorme congelada. Uma viagem, aquela pedra de gelo gigante) e, em seguida, fomos para Franz Josef. Melhor carona, impossível! No fim, fui para as duas cidades que queria. Quando saí do carro, ainda me disseram que em dois dias continuariam a viagem para o Norte e, caso eu quisesse uma outra carona, era só esperar por eles em uma hora tal, num ponto da estrada.

Franz Josef é uma cidade pequena. Pequena, mesmo. 250 habitantes. E tem, exatamente, uma rua principal com três transversais. Fiquei um dia e meio lá. Conheci um povo legal. Fiz umas cinco trilhas (só ao redor do bloco de gelo, já que para colocar o pezinho teria que pagar, no mínimo, 100 dólares por meio dia.

De novo o vento bateu... acordei e não fazia a MENOR idéia de onde ir (dessa vez mais do que antes). Começaria agora a estrada rumo ao litoral norte, mas não tinha nada em mente. Fui para estrada na esperança de encontrar o mesmo casal, mas não foi preciso. Em dois minutos parou um senhor Maori que estava indo para Hokitika, uma cidade costeira. Pensei, é lá mesmo. E daí que o homem foi me dando uma puuuuuuta aula sobre a cultura Maori e a natureza kiwi durante as duas horas de viagem.

Fiquei um dia na cidade e ela super não tem nada. A não ser pelo fato de ser o principal ponto de produção de Pounamu (é tipo um patuá, talismã, que os Maoris usam no pescoço. Eles são normalmente feitos de jade e tem diferentes formatos, com diferentes significados). O adereço costuma ser muuuuuuuuuito caro, mas eu achei o meu por uma bagatela (lindooooooooo!!), exatamente como eu queria, na praia. Tinha um senhor com uma pequena mesinha. E Hokitika foi isso: encontrar meu pounamu! Meio dia e uma noite foi muito mais do que suficiente.

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